Divulgando o mundo do kabuki em português e japonês – 1ª parte – por Aoki Yumi

Esposa de terceira geração japonesa que se tornou parte do mundo do teatro japonês tradicional; “Vovô” era o pintor Manabu Mabe

Um dos setores mais tradicionais do Japão, o Rien do Kabuki. Uma nipo-brasileira de terceira geração se casou nesse mundo do teatro, e há a possibilidade de que no futuro apareça um ator de Kabuki nipo-brasileiro de quarta geração de imigrantes japoneses no Brasil. É Yumi Aoki, esposa do segundo Otani Hiromatsu [nome em japonês, sobrenome seguido de nome]. Segundo o site Enciclopédia de Atores de Kabuki (https://meikandb.kabuki.ne.jp/actor/255/), no perfil de Otani Hiromatsu (2º, 31 anos) está escrito: “Com feições gentis, é uma estrela que atua principalmente como onnagata (papéis femininos). Recentemente, tem aumentado suas apresentações com Ichikawa Ebizo, expandindo seu repertório incluindo papéis masculinos”. A esposa deste ator de Kabuki, Yumi Aoki, pensando na turnê de seu marido no Brasil, decidiu escrever mensalmente uma coluna explicativa sobre Kabuki em japonês e português para os leitores locais. (Redação)

Yumi Aoki (fotógrafo TADEAI)

Vocês conhecem o Kabuki?

Talvez tenham a imagem de rostos pintados com maquiagem branca, com linhas vermelhas e pretas, vestindo quimonos pesados e fazendo mie (poses dramáticas).

Atualmente, no drama histórico da NHK “Berabo”, o protagonista é Tsutaya Juzaburo, chamado de rei da mídia de Edo, retratando artistas de ukiyo-e. Vocês estão assistindo? Nele apareceu o personagem do ator de Kabuki Ichikawa Monnosuke II. Este ator com o nome Ichikawa Monnosuke está, na verdade, ativo ainda hoje. O atual Ichikawa Monnosuke é o oitavo, e após 260 anos, ainda carrega o mesmo nome no palco.

Kabuki se escreve com os caracteres de canção (uta), dança (mai) e pessoa/técnica (gi/hito) e se lê “kabuki”. É uma arte total que combina música, dança e atuação. É um símbolo da cultura japonesa que perdura há 400 anos desde o período Edo e um patrimônio nacional. Em 2008 foi registrado como Patrimônio Cultural Imaterial da UNESCO.

A origem da palavra kabuki vem de “kabuku” – viver de forma excêntrica, um pouco fora do senso comum. Por isso, o início do Kabuki era extravagante, elegante e tinha aspectos um tanto questionáveis. Com o tempo, tornou-se uma arte tradicional com formalidade.

Otokodate Hana no Yoshiwara, papel de Shinzo Umegae

Para se tornar ator, não há audições. Linhagem e nome são o mais importante. Por exemplo, o nome Ichikawa Monnosuke é chamado de “myoseki” (nome artístico hereditário), e estes “myoseki” são herdados de geração em geração (shumei/sucessão), herdando completamente a arte e o prestígio relacionados ao nome. Por isso, os atores de Kabuki não são apenas artistas, mas são vistos como “portadores da cultura”, e muitos se tornam Tesouros Nacionais Vivos [pessoas reconhecidas pelo Ministério da Cultura japonês como preservadores de importantes propriedades culturais intangíveis].

No mês passado, a partir de maio de 2025, no Teatro de Kabuki de Tóquio, começou a apresentação de sucessão do grande nome “Onoe Kikugoro”, com festividades diárias. O pai, sétimo Kikugoro, aparentemente já fez apresentações no Brasil. Alguém assistiu?

Bem, existe uma presença inseparável destes atores de Kabuki. São as esposas dos atores de Kabuki, as “esposas do Rien”.

A sociedade tem esta imagem das “esposas do Rien”:

Conhecem a agenda do marido, cumprimentam diariamente os patronos no saguão, organizam presentes de meio do ano e fim do ano sem falta. Enquanto arejam os figurinos, imaginam silenciosamente como foi a apresentação de hoje. Mantêm relações harmoniosas com pessoas relacionadas, escrevem cartões de Ano Novo e cartas de agradecimento à mão cuidadosamente com pincel.

Além disso, há a expectativa pesada de “dar à luz um menino que seja sucessor”.

Não podem ser muito extravagantes, nem muito simples. Belas, modestas, mas com elegância. Conhecedoras da cultura tradicional, saber vestir quimono é básico, ter excelente senso para quimonos, praticar cerimônia do chá e ikebana, e, se possível falar inglês, seria perfeito.

…Parece quase uma profissão.

Porém muitas partes são realmente precisas.

Eu estou no mundo do Kabuki como esposa do Rien, junto com meu marido.

Apenas, estou em uma posição um pouco diferente.

Sou nipo-brasileira de terceira geração. Meus avós foram para o Brasil quando crianças e se casaram entre japoneses. Minha mãe nasceu e cresceu no Brasil, veio ao Japão como intérprete da Expo após se formar na universidade, conheceu meu pai e se casou. Nasci e cresci no Japão, mas desde pequena ia frequentemente ao Brasil.

Devido à forte influência de minha mãe, dizer “sou japonesa” não me soa natural. Mas, quando vou ao Brasil, dizer “sou brasileira” também é completamente diferente.

Eu, por uma coincidência do destino, me casei no centro da arte tradicional japonesa. Para mim, que cresci desde pequena com o ritmo brasileiro, era um mundo completamente desconhecido. Mas justamente por isso, acredito que há coisas que posso ver e transmitir.

Yumi quando criança, entre a sra. Yoshino e o pintor Mabe

O tio-avô de minha mãe é o pintor Manabu Mabe. Muitos de vocês devem conhecê-lo, é a pessoa chamada de “Picasso do Brasil”. Eu o chamava de “vovô de Tóquio” e ele era uma presença muito próxima, como avôs.

Como pintor nipo-brasileiro representativo do Brasil, foi uma ponte entre Japão e Brasil, atuando mundialmente. Ainda me lembro de quando o acompanhei a uma exposição individual onde ele apresentava suas obras à Imperatriz Michiko (na época). Acredito que desde então, em algum lugar, pensava “se eu também pudesse um dia fazer algo que conectasse Japão e Brasil”.

Em novembro de 2023 nasceu meu filho.

Se crescer saudável e ficar grande, em alguns anos ele se tornará o primeiro ator de Kabuki nipo-brasileiro do Japão. Se num futuro próximo meu marido e meu filho pudessem apresentar Kabuki no palco brasileiro. Esse é meu sonho atual.

O Kabuki, que mesmo no Japão é considerado de difícil acesso. Se através de mim as pessoas pudessem senti-lo mais próximo, ficaria feliz. Especialmente para todos do Brasil, para que esta misteriosa e bela arte japonesa possa ser sentida como “algo de vocês”.

A partir deste mês, começo a escrever esta série de colunas sobre Kabuki.

Agradeço de coração ao pessoal do Brasil Nippou por esta oportunidade maravilhosa.

Foto de palco do marido, Otani Hiromatsu

【Otani Hiromatsu (segundo, 31 anos)】

Segundo filho do oitavo Otani Tomouemon, neto do Tesouro Nacional Vivo, o quarto Nakamura Jakuemon (como Otani Tomouemon foi estrela de cinema).

Em maio de 1998, primeira apresentação no Teatro de Kabuki com o nome Aoki Takanori.

Em janeiro de 2003, no Teatro de Kabuki em ‘Sukeroku’, sucessão do nome segundo Otani Hiromatsu no papel de Kamuro e estreia no palco.

Recentemente formou companhia com o décimo terceiro Ichikawa Danjuro, estudando amplamente vários papéis centrados em onnagata.

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