COLUNA: PROFESSORA LORETANA, personalidade dos 130 anos do Tratado de Amizade e Comércio Brasil-Japão

Por Mario Jun Okuhara

A crescente campanha pela redução da jornada dos professores do Centro do Professorado Paulista precisou fazer uma pausa momentânea por um motivo muito especial: a comemoração dos 99 anos de sua presidente, Professora Loretana Paolieri Pancera, celebrada com a apresentação do coral que leva seu nome. Natural de Piracicaba, ela é filha de imigrantes italianos e dedicou sua vida ao magistério.

Nascida na década de 1920, época em que o índice de analfabetismo no Brasil alcançava cerca de 80%, Loretana testemunhou — como aluna e, depois, como docente — grandes movimentos educacionais no país, como o ideário da Escola Nova, a expansão das escolas profissionalizantes, a criação do Ministério da Educação e Saúde em 1930 e o surgimento da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), em 1961.

Como paralelo histórico, durante a década de 1930, enquanto o Brasil avançava na regulamentação nacional da educação com as reformas promovidas pelo ministro Francisco Campos, cerca de 400 escolas japonesas foram fechadas. Era um período de forte nacionalismo que prejudicou a educação das famílias de imigrantes japoneses. Campos também foi o responsável pela Constituição do Estado Novo em 1937, período marcado por intensa perseguição política a estrangeiros no país.

Sensibilizada pelas dificuldades que muitas famílias japonesas enfrentavam para oferecer educação de qualidade aos filhos, Loretana aproximou-se ainda mais da comunidade e lecionou também para muitos descendentes de japoneses. Sua afinidade com a comunidade foi tamanha que, em 1993, fundou a União Educacional Brasil-Japão – UEBRAJA, responsável pela organização de 17 Simpósios Nipo-Brasileiros de Educação em São Paulo, em Curitiba e no Japão. Em 2008, durante o 17º Simpósio Nipo-Brasileiro de Educação, realizado no Centro do Professorado Paulista, foi apresentado o programa estadual “Viva Japão”, que desenvolveu junto às escolas, um projeto de pesquisa e valorização da cultura japonesa. Nesse mesmo ano, a Professora Loretana recebeu a comenda “Kasato-maru”, em reconhecimento à sua contribuição às relações Brasil-Japão.

Curiosamente, das cerca de trinta mulheres que integram o Coral “Loretana Paolieri Pancera”, três são professoras aposentadas nisseis — filhas de imigrantes japoneses — que esbanjam suas vozes, outrora entoadas nas salas de aula.

Em 2019, a Professora Loretana comentou comigo que o surgimento de educadoras nipo-brasileiras foi algo natural, pois a educação sempre foi prioridade para os imigrantes japoneses, que viam a sala de aula como um espaço sagrado. Muitas filhas de imigrantes tornaram-se professoras e pedagogas em escolas públicas e privadas, contribuindo para a formação de gerações de brasileiros. A experiência da imigração ensinou valores como trabalho árduo, disciplina, valorização dos estudos e respeito à coletividade — princípios que permanecem vivos, agora representados pela quarta geração de brasileiros descendentes de japoneses, atuantes também na educação.

A professora Loretana Paolieri Pancera

Loretana lecionou durante 41 anos, entre 1945 e 1986, dedicando-se à formação docente e à valorização do magistério. Permanece à frente da presidência do Centro do Professorado Paulista, mas agora apoia uma nova geração de líderes, como o Professor Alessandro Soares, responsável pela atual campanha pela redução da jornada dos professores. Um legado que continua inspirando a construção de uma sociedade mais justa e instruída.

Em 2023, ao participar de um podcast, a longeva educadora traduziu em poucas palavras o sentido de sua longa e apaixonada trajetória, parafraseando Fernando Pessoa: “Tudo vale a pena se a alma não é pequena”.

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